segunda-feira, 27 de março de 2006

HAMLET, ATO III, CENA 1



"Ser ou não ser - eis a questão.


Será mais nobre em nosso espírito sofrer pedras e setas com que o destino enfurecido nos alveja, ou insurgir-nos contra um mar de provações e em luta pôr-lhes fim?


Morrer... dormir... não mais.


E com o sono - dizem - extinguir as dores do coração e as mil mazelas naturais a que a carne é sujeita; eis uma consumação ardentemente desejável.


Morrer... dormir... dormir! Talvez sonhar. Eis onde surge o obstáculo! Pois os sonhos que tenhamos no sono da morte devem fazer-nos hesitar quando tivermos escapado ao tumulto vital: e é essa reflexão que dá à desventura uma vida tão longa.


Pois quem suportaria o açoite e os insultos do mundo, a afronta do opressor, o desdém do orgulhoso, as pontadas do amor humilhado, as delongas da lei, a prepotência do mando e o achincalhe que o mérito paciente recebe dos inúteis, podendo ele próprio encontrar seu repouso com um simples punhal?


Quem agüentaria fardos gemendo e suando numa vida servil, senão porque o terror de alguma coisa após a morte - o país não descoberto, de cujos confins não voltou jamais nenhum viajante - nos confunde a vontade, nos faz preferir e suportar os males que já temos, a fugirmos para outros que desconhecemos?


E assim a reflexão faz todos nós covardes.


E assim o matiz natural da decisão se transforma no doentio pálido do pensamento. E empreitadas de vigor e coragem, refletidas demais, saem de seu caminho, perdem o nome de ação."


(William Shakespeare)

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