quarta-feira, 22 de abril de 2009

DEPOIS - Sete histórias de horror e terror


Description:
Organização e tradução de Heloísa Seixas.
Editora Record, 1998.

“Quando objetos do cotidiano são marcados por uma sugestão de horror, estimulam a imaginação mais do que os objetos de aparência estranha." (“Os Salgueiros”, de Algernon Blackwood)


Uma ótima antologia de contos de horror de autores de talento e prestígio, numa seleção que foge do óbvio e propicia a novas descobertas literárias. Heloísa Seixas está de parabéns como organizadora, tradutora e com fino talento para escolha de excelentes textos.


Ingredients:
“Depois”
de Edith Wharton
(1862-1937)
Um casal de americanos abastados procura uma casa tranqüila e o mais precária possível no interior da Inglaterra, e ao perguntarem se o lugar tem fantasma, ouvem da prima da esposa: “Ah, claro que tem sim, mas vocês nunca vão saber”. Essa é a premissa do conto da escritora americana autora de “A Era da Inocência” e uma das favoritas de F. Scott Fitzgerald. O clima bem humorado do início vai dando lugar a algo que parece um sonho estranho, sufocado. A protagonista me faz lembrar alguma heroína angustiada dos primeiros filmes americanos de Hitchcock. No fim fiquei com uma leve sensação de ter sido traído, de que Edith Wharton me entregou não exatamente o que prometeu. Mesmo assim, mesmo tendo saboreado um prato que não pedi, fiquei satisfeito com o bom gosto da “chef”. E um bônus: o conto me deu idéia para escrever meu próprio conto de fantasma. (39 págs.)

“O Túmulo”
de H. P. Lovecraft
(1890-1937)
O maior especialista no assunto de toda essa coletânea aparece aqui com uma narrativa mais lúgubre e funesta do que macabra e apavorante, com ressonâncias de seu mestre Edgar Allan Poe. Um jovem aristocrata torna-se obcecado por uma velha cripta abandonada no sopé de um morro, próximo à mansão da família, e por mais de uma década passa a ter delírios que o fazem crer que seu destino é entre os habitantes daquele sepulcro esquecido e amaldiçoado. Quem nunca leu nada do bom e velho HPL e for apresentado à sua literatura através desse “O Túmulo”, não fará idéia do que sua medonha e devastadora imaginação é capaz de produzir. (13 págs.)

“A Janela Aberta”
de Saki
(1870-1916)
O curto conto de Hector Hugh Munro (que assinava como Saki) é tanto um exercício de horror quanto de humor, aliás bem ao seu estilo. Pode-se ler como um presságio horrendo e apavorante da mesma forma que pode ser uma piada hilária e infame. Inclusive nos anos 90 (se minha memória não me falta) “A Janela Aberta” foi adaptado para o cinema no Brasil em forma de curta-metragem, tendo Janaína Diniz como a imaginativa protagonista, com extrema fidelidade ao texto original. (5 págs.)

“O Quarto Mobiliado”
de O. Henry
(1862-1910)
O mestre dos finais surpreendentes e padrinho dos desajustados e párias da sociedade norte-americana, William Sydney Porter (verdadeiro nome de O. Henry) nos presenteia aqui com um melancólico conto de amor perdido onde as coincidências podem não existir, mas as ironias macabras às vezes podem nos surpreender. Daria um excelente argumento inicial – ou final – para um longa-metragem policial contemporâneo. (9 págs.)

“Chá Verde”
de Sheridan Le Fanu
(1814-1873)
O irlandês Le Fanu, o mais velho de toda a coletânea, nos mostra aqui que horror é apenas uma questão de ponto de vista. Criaturas com olhos de fogo, macaquinhos no sótão, entidades fantasmagóricas que vem e vão, abominações perturbadoras não precisam ser necessariamente fenômenos inexplicáveis e coisas do terreno do sobrenatural. E talvez seja justamente isso o que mais perturbe nesse fantástico conto de medo e angústia. (43 págs.)

“Sonata ao Luar”
de Alexander Woolcott
(1887-1943)
Como dizia Cortázar (ou seria Hemingway?), um bom conto deve levar o leitor a nocaute. O crítico de teatro e radialista nova-iorquino Alexander Woolcott sabe levar o leitor pela mão através da escuridão até um desfecho impactante de loucura e pavor, em poucas páginas de sua rara e eficaz narrativa de terror. (4 págs.)

“Os Salgueiros”
de Algernon Blackwood
(1869-1951)
O melhor ficou para o final. Não é à toa que “Os Salgueiros” é o conto de horror favorito de H. P. Lovecraft e que este também é considerado um dos grandes contos fantásticos da língua inglesa. Dois amigos viajam pelo rio Danúbio numa canoa e decidem acampar numa ilhota no meio do rio cercada por salgueiros durante a noite antes de seguir viagem. Estranhas visões de uma lontra descomunal, um vulto num barco distante, plantas que fazem movimentos não-naturais e a clara sensação de que estão cercados por forças sobrenaturais fazem com que a dupla perceba que está na fronteira de uma dimensão desconhecida, maléfica e perigosa. As primeiras páginas são idílicas como uma pintura de Monet, quase pode-se ouvir a sinfonia Pastoral de Beethoven. Aos poucos o estranho, o insólito, vai se insinuando na paisagem, e quando se percebe, quase se sufoca em meio à ameaça inexplicável dos salgueiros e de uma ameaça que não se entende e não se vê, apenas se sente. (60 págs.)



Directions:
DEPOIS - Sete histórias de horror e terror
Organização e tradução de Heloísa Seixas.
208 páginas. 2a. edição.
Design da capa: Tita Nigri. Ilustração de Mozart Couto.
Editora Record, 1998.

4 comentários:

  1. Falando em contos de horror (meu formato literário favorito + meu gênero favorito), estou tentando montar uma seleção dos melhores de todos os tempos, um de cada autor - o que torna a empreitada ainda mais difícil, diante de monstros sagrados como Lovecraft, Poe, Maupassant, Matheson, etc. A lista a que cheguei até agora é essa:

    - "A Pata do Macaco" de William Jacobs,
    - "Flor, Telefone, Moça" de Carlos Drummond de Andrade,
    - "Um Sussurro nas Trevas" de H. P. Lovecraft,
    - "Os Salgueiros" de Algernon Blackwood,
    - "O Horla" de Guy de Maupassant,
    - "Os Fatos no Caso do Sr. Valdemar" de Edgar Allan Poe,
    - "A Sirene no Nevoeiro" de Ray Bradbury,
    - "O que Aconteceu Sobre a Ponte do Owl Creek" de Ambrose Bierce,
    - "As Duas Garrafas de Molho" de Lord Dunsany,
    - "O Aniversário da Vovó" de Fredric Brown,
    - "O Bicho-Papão" de Stephen King,
    - "Pesadelo nas Alturas" de Richard Matheson,
    - "A Noite de Barriga Pra Cima" de Julio Cortázar,
    - "A Livraria das Obras Inéditas" de Nelson Bond...

    Ainda quero incluir autores como Le Fanu, Saki, Dickens, O. Henry, Robert Bloch, Conan Doyle, José J. Veiga, porém não li contos suficientes deles para incluí-los numa seleção dessas.

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  2. não sei se esses filmes são trash, ou se você gosta do genero, mas, tenho um amigo que adora - uma vez me fez assistir um que so tinha atores com deformidades.

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  3. Cesar, antes de mais nada, estamos aqui falando de contos, de LITERATURA, e não de filmes, ou CINEMA. AMO CINEMA, mas também sou louco por contos, por livros, por literatura!!! Em segundo, eu DETESTO o horror explícito, trash, "sangue & tripas", que a meu ver só causa nojo e não medo, que sempre apela para o óbvio, e que desconhece a sutileza e a elegância. AMO o horror psicológico, sutil, implícito, aquele que não mostra NADA, apenas sugere, apenas alimenta a nossa imaginação para que nós mesmo criemos nossos monstros e pesadelos particulares.

    Na minha opinião de quem consome livros, contos e filmes de horror psicológico há pelo menos 35 anos, esse é o tipo de literatura que mais amplia os horizontes da nossa imaginação, que mais alarga nossos horizontes mentais, que mais se aplica àquela velha e sábia frase de Einstein, "quando o cérebro se amplia com uma idéia, jamais volta a ter o tamanho que tinha antes". ;-)

    Leio contos de horror psicológico desde criança, tenho vários livros de antologia de contos fantásticos aqui em casa, a maioria de autores do século 19 e início do século 20, e queria MUITÍSSIMO poder trocar idéias com outros leitores de contos de horror desse período. Só não encontro com quem. Os grupos do orkut de "contos de horror", "contos de terror" ou "contos fantásticos" se resumem a divulgar contos escritos pelos membros desses grupos, e ignoram a existência dos grandes autores do gênero, por isso não me interessam.

    Eu que já sou minoria absoluta em várias áreas, parece que esse é mais um assunto que pra mim é tão corriqueiro e normal quanto comer ou respirar mas que não encontro outro ser humano sequer com quem trocar idéias a respeito porque as pessoas ou não lêem, ou lêem best-sellers contemporâneos que estão nas listas dos mais lidos e mais vendidos, ou lêem livros técnicos ou livros de auto ajuda. Um espanto, um inferno. :-(

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  4. Se desse para dar uma dica de conto (como já comentamos no grupo): "O Terror nas Alturas", do Sir Arthur Conan Doyle. Do Machen, "Psicologia", que compõe o conjunto de contos "Ornamentos em Jade". Do Dickens, "O Sinaleiro". Machado de Assis, "A Igreja do Diabo". Henry Kuttner, "Ratos do cemitério". Bem... acho que teria bastante coisa para incluir aí.

    De qualquer forma, tua antologia de contos está muito boa.

    Abraços
    Leonardo N. Nunes

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