sábado, 16 de junho de 2007

O CARA E O RETROVISOR

O cara passava a maior parte do seu tempo no quarto. Numa parede havia uma grande estante embutida que ele mesmo desenhou e mandou fazer. Branca, grande, que ia do chão ao teto, cheia de espaços para os livros, revistas em quadrinhos, Playboys e similares, fitas VHS, CDs de música, um pequeno aparelho de som, um videocassete, E ali, no meio de tudo, ficava a televisão. A TV, a babá eletrônica, a janela para o mundo, onde "the world crashes in, into my living room", como dizia a canção dos Talking Heads. Para o cara a televisão era tudo. Ou quase tudo. Enfim, vocês entenderam.

Na parede oposta, ao lado da cama de campanha do cara, havia uma mesa de madeira com suas coisas pessoais, uma papelada amarfanhada e o computador. Para o cara aquele monitor era outro portal fundamental para o mundo. Aliás, para vários mundos diferentes, de várias dimensões. Para escrever, ler e-mails, navegar por sites pornôs, jogar videogames, conversar em salas de bate-papo, fazer pesquisas para a faculdade, fazer pesquisas para as idéias mirabolantes e estapafúrdias que ele mesmo tinha. Para o cara era como entrar literalmente numa grande variedade de dimensões de prazer e diversão. Enfim, vocês também entenderam.

O problema é que quando o cara estava ao computador, ele não podia ver TV, e quando queria ver TV, não podia aproveitar o computador. Dilema dos dilemas, ser ou não ser, TV ou PC. Da cama estreita até que o cara podia vislumbrar algum site interessante enquanto via um filme ou um seriado, mas usar o mouse daquele jeito (ainda) era anatomicamente impossível. Até ficar girando que nem um frango de padaria na cadeira ergométrica do computador o cara tentou, mas se sentiu um completo idiota em tempo recorde – e olha que isso era muito difícil! Enquanto o cara se angustiava em resolver esse dilema, a TV e o PC ficavam se encarando, ameaçando-se mutuamente, arrotando cada qual as suas vantagens. Era um duelo silencioso entre dois grandes mestres, como Karpov e Korshnoi, como John Wayne e Clint Eastwood. Por favor, vocês também entenderam.

Até que a solução do grande dilema surgiu da forma mais simples do mundo, com ajuda dos badulaques de sua mãe. Um dia ela estava fazendo a limpeza geral numa gaveta do banheiro e decidindo o que seria jogado fora e o que iria voltar a ter utilidade. O cara passou e viu um daqueles espelhos redondos de dois lados que as mães adoram, com um lado normal e outro ampliado, para se ver bem de perto e ter motivos reais para dizer que os pés de galinha estavam crescendo e que os filhos e o marido estavam acabando com ela. Lembrando que ele tinha grudado um daqueles suportes pretensamente úteis para sustentar papéis no canto superior do monitor, o cara juntou A com B e perguntou à mãe se podia ficar com o espelho. Sem se importar com as esquisitices do filho, ela lhe deu o espelho dupla-face.

A partir daquele dia o cara criou o primeiro espelho retrovisor de computador do mundo, que o permitia navegar na internet e ver televisão ao mesmo tempo, sem precisar girar a cadeira, o pescoço ou se preocupar com uma questão tão profunda e relevante como essa era para a Humanidade.

Para não dizerem que eu estou mentindo, o cara até apareceu no caderno de informática dO Globo uns meses depois, graças a sua grande invenção!

 

6 comentários:

  1. ahahah Boa Idéia!
    Mas acho que eu continuaria a não prestar atenção a tv

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  2. Se você acha a TV mais importante, sim. Mas o cara queria ver os dois ao mesmo tempo!

    Tem louco pra tudo, né? ;-)

    Beijos!

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  3. Amei a idéia. Preciso arrumar um espelho urgente ;-)
    Beijão

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  4. Primeiro comentário: (antes de chegar ao final do texto) ....- Não creio !!!!
    Segundo comentário: Como "EU" não pensei nisso antes
    Terceiro; Pergunta: Já patenteou?????

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  5. Pede pra "mamãe", hehehe!

    E deposita na conta do cara os direitos autorais... ;-)P

    Beijão!

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  6. 1. Sim, o cara fez isso...

    2. A mesma coisa que eu pensei quando assisti a "A Bruxa de Blair" no cinema, que custou duas mariolas e rendeu milhões.

    3. Não perguntei pro cara. Mas vi a foto e a matéria no jornal mesmo, de verdade. Creio que isso já dá todos os direitos de registro a ele. ;-)

    Beijão!

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