terça-feira, 3 de julho de 2007

O CARA E O SUSHI

Clarice foi a quinta namorada e a segunda grande mulher e musa na vida do cara. Entre muitas outras coisas, eles adoravam comida chinesa. Sempre que podiam, freqüentavam um restaurante bacana no Largo do Machado, em cima de um salão de bilhar. Comiam sempre yakissoba. De frango, de carne, de frutos do mar, misto, sempre o bom e saboroso yakissoba. Clarice de vez em quando sugeria que eles mudassem para sukyaki, que era preparado pelo cozinheiro ao lado da mesa e cheirava muito bem, mas eles acabavam protelando a mudança de cardápio.

Como o restaurante servia comida chinesa e japonesa, as garçonetes costumavam passear com bandejas de comida nipônica o tempo todo. Boa parte da clientela era de executivos japoneses e sempre pediam sushis, sashimis, tekkamakis, kappamakis, e outros acepipes da terra do sol nascente. Aquela comida exótica e multicolorida enchia os olhos do cara e de Clarice, que enquanto degustavam seu querido yakissoba, ficavam a ver os navios de sushis e sashimis singrando pelo restaurante, como se esses lhes sorrissem e acenassem do alto dos ágeis e equilibrados braços das garçonetes.

Esse papo preconceituoso de "argh, isso é peixe cru!" passava longe da cabeça e dos curiosos estômagos do casal, e um dia eles decidiram experimentar o que se comia no país de National Kid. Antes de mais nada, chamaram a garçonete que costumava atendê-los e baixinho explicaram a situação. "A gente nunca comeu sushi mas tá louco pra provar, o que você sugere?" A moça sorriu diante da virgindade gastronômica dos dois e ficou feliz por poder proporcionar sua entrada no maravilhoso mundo da comida japonesa. Explicou que era melhor pedir uma dupla, pois assim cada um experimentava um sushi para ver se realmente os apetites do casal seriam tão seduzidos quando seus olhos. Decidiram por atum, por ser mais barato e pela familiaridade com aquele peixe imenso que eles conheciam das latinhas em óleo vegetal.

Diante dos pequenos sushis de atum, prontos para o sacrifício, a garçonete ensinou à Clarice e ao cara como usar os pauzinhos – ou hashis, para os iniciados – e assim se deu o primeiro contato dos dois com a famosa cozinha japonesa. Clarice detestou aquele bolinho de arroz grudento com um filezinho de atum cru em cima e o cara – surpreendentemente – se apaixonou pelo sabor do sushi na mesma hora. Ficou entusiasmado e queria pedir uma porção maior, sugestão definitivamente vetada por ela. E o bom e velho yakissoba misto, quentinho e cheiroso de sempre aterrisou na mesa em poucos minutos.

Na vez seguinte que Clarice e o cara foram ao restaurante, ele avisou na hora: "Você eu não sei, mas eu vou comer sushi. Um grande prato de sushi de atum." Ela nem cogitou tal sugestão e ficou mesmo num saboroso yakissoba de frutos do mar. Sem discussão, os dois jantaram tranqüilamente. Isso até o cara perceber que sua namorada não desgrudava os olhos de sua generosa porção de sushis de atum, enquanto mandava o yakissoba pra dentro. Meio envergonhada e curiosa, ela pediu "posso provar um sushi de novo?" Ele riu, sentiu-se feliz por ela dar o braço à torcer e esforçando-se em equilibrar o pequeno bolinho de arroz e atum com o hashi, o levou até a boca de sua amada. O cara parou para observá-la. Clarice mastigou demoradamente, revirou os olhos e por fim decretou: "É, até que não é ruim." Ele sorriu, disse algo que a deixou levemente irritada e ambos dedicaram os minutos seguintes a explorar os sabores únicos de suas refeições em silêncio.

Um tempo depois, após muitas massas, churrascos, pastéis de carne de soja, saladas, pratos árabes e mexicanos, Clarice e o cara voltaram ao seu templo alimentar oriental favorito. Novamente ele deixou bem claro: "Você eu não sei, mas eu vou pedir sushi. E desta vez vou provar outros peixes também!", no que ela rebateu "EU TAMBÉM vou pedir sushi!"

Sorridente, a garçonete usual trouxe o primeiro barco de sushis do casal, eles não demoraram a aprender a manipular os hashis como legítimos samurais e por muito tempo – muito tempo mesmo! – Clarice e o cara nunca mais sentiram nem cheiro de yakissoba.

 

9 comentários:

  1. Que bom ler este texto, que mostra sua capacidade de escrever de forma saborosa sem precisar de uma grande fato acontecido, escreve o cotidiano, coisas simples sob olhos que enxergam seu lado mais encantador, divertido.... Vou explorar mais isto aqui, acaba de pegar um peixe! Abraços!

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  2. Muito obrigado pelas palavras de incentivo, Rodrigo! Só tento fazer crônicas divertidas para mim. Se também divertem os amigos e visitantes que me lêem, isso se torna um prazer maior ainda.

    Explore sim, fique à vontade! Só do cara já tem um bom punhado de crônicas, fora meus textos em geral. Sugiro os primeiros, sobre jazz, cinemas de rua e vidas passadas, quando eu estava mais inspirado. Mas como já disse, fique à vontade nesse alfarrábio de idéias e imagens!

    Abraços!

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  3. Oi, Oz!

    Coincidentemente essa semana eu e Fernanda (minha comadre que está de visita aqui em casa), comemos sushi duas vezes já!!!
    Uma vez em um restaurante em Ipanema, que tem um delicioso rodízio, e outro dia no shopping quando estávamos comemorando o aniversário do Henrique.

    Seu texto mais uma vez está, assim como os sushis e sashimis, delicioso!
    Parabéns!!!
    Adorei!

    Beijos!

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  4. Renata, tomara que eu possa encher a cara de sushis e sashimis na terça-feira também, no meu aniversário!!!

    E mais uma vez obrigado pelo teus comentários carinhosos e incentivadores!!!

    E você já está previamente convidada, se tiver alguma coisa. Aliás, precisamos nos ver e bater papo, menina! Fora "A Dança dos Vampiros"! Passa aqui pra ver os DVDs que te interessam e a maquetona do Palácio do Jabba em dois andares!!!

    Beijo grande!!!

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  5. Adorei o texto, leve e gostoso...como sushi(que eu adoro) ^_^

    Parabéns Oz, estou adorando esta saga do Cara.

    Beijos

    Sil

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  6. Fico muito feliz e grato pelas suas palavras de carinho e incentivo, Sílvia!

    Pelo visto, o cara veio pra ficar. Tem mais meia-dúzia de crônicas dele vindo por aí... ;-))

    E enquanto isso e vou depurando o meu estilo literário.

    Beijão!

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  7. Hummm me deu vontade de encarar este tal de sushi.
    :))

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  8. Experimente, Lua!!! Sushi e sashimi são as melhores coisas do mundo depois de sexo!!! :-)))

    Beijos!

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  9. pois eu não sei quando foi a mudança radical de "não como nem por decreto" para "amo de paixão"..

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