Maurício: "Quem já entrou na Casa dos Quarenta sabe o que estou sentindo. Eu entrei. E a porta se fechou atrás de mim. As tábuas rangiam sob os meus pés. Tento fugir mas já não encontro o trinco da porta."
Amanhã, dia 10 de julho, levanto acampamento e me mudo definitivamente para a Casa dos Quarenta. Nunca imaginei que chegaria a esse ponto. Quando eu mal entrava na Casa dos Vinte, uma namorada me disse que era espantoso eu ainda estar vivo, pelo jeito que atravessava a rua, olhando pro tempo, ao invés de para a direita e esquerda. O fato é que eu consegui atravessar muitas ruas até chegar aqui, às portas da Casa dos Quarenta, ileso, sem nenhum acidente.
Helena: "E pensar que eu passei pela Casa dos Trinta sem aproveitar nada. Olhei para a Casa dos Quarenta e achei atraente. Me imaginava madura, realizada. Entrei. Não podia imaginar que a Casa dos Quarenta seria assim por dentro. Perdi a festa da Casa dos Trinta e agora não posso voltar."
A Casa dos Trinta não foi muito condescendente comigo. Pelo menos não fisicamente. Ganhei barriga e algumas dezenas de amaldiçoados quilos a mais. Uma diminuição preocupante do fôlego e do bom e velho preparo físico. E uma barba cerrada que uma amiga insiste em dizer que me faz parecer um grande cineasta. A Casa dos Vinte foi mais generosa. Namoradas, trabalhos, viagens, amigos, muita coisa boa. Se bem que a experiência que a Casa dos Trinta deixou foi inigualável. Parece que tem coisas que a gente só aprende mesmo com o tempo.
Maurício: "E aqui estou eu, cercado de fantasmas, suando frio e me apalpando. As pessoas invariavelmente começam a se apalpar na Casa dos Quarenta. Para verem se é verdade, e que dorzinha é aquela."
Não compartilho da crise pessoal que muita gente atravessa ao se deparar com a Casa dos Quarenta. Quando entrei na Casa dos Trinta, me disseram que a vida começava lá. Hoje, dez anos depois, tenho a forte suspeita de que a vida começa aqui. Se bem que a vida começou mesmo há várias casas atrás. Minha infância foi fantástica! Talvez seja por isso que carrego ela comigo até hoje. Suspeito que vou precisar muito dela aqui, na Casa dos Quarenta.
Helena: "Tento desistir da idéia, tento voltar. Invento que esqueci minha bolsa na Casa dos Trinta, a saída. Mas só há uma saída na Casa dos Quarenta: a que dá para a Casa dos Cinquenta."
Meu avô morreu na Casa dos Oitenta. Meu pai na Casa dos Setenta e minha mãe na Casa dos Sessenta. Agora, entregando as chaves da Casa dos Trinta e seguindo em frente, percebo que pra sair da Rua dos 'Enta, só se cruzar a barreira dos Cem. De preferência com cinto de segurança, airbag e com o motor sempre revisado. Mas não que sair da Rua dos 'Enta seja fundamental. O importante mesmo é saber curtir a vida. E evitar pegar friagem e nunca esquecer de comer vegetais.
Maurício: "Depois de uma certa idade a gente só enxerga os pés de longe, lá embaixo... e nós já fomos tão íntimos! Quando eu era bebê brincava com meus pés. Mordia, lambia. Depois nunca mais estivemos tão próximos. Às vezes tento visitá-los, mas a coluna não deixa. Viver é ir lentamente se distanciando dos pés."
Há uns anos atrás estava conversando com um velho amigo e surgiu o assunto de que já não éramos mais jovens. Daí pra falar de pequenas dores, herança genética e remédios foi um pulo. Quer dizer, pulo não, porque nos faltava o preparo físico. O pior foi perceber, no meio do papo hipocondríaco, que alguns anos antes nós costumávamos falar de namoradas, festas e prazeres mais apropriados à juventude. Batemos na boca e deixamos de lado a conversa quase mórbida, para nunca mais retomá-la.
Helena: "A vida é como uma gangorra. Quando você chega aos quarenta, está no topo. Tem uma visão privilegiada de tudo. Se sente realizada, superior, a tal. Por dezessete segundos. Depois começa a descida."
Sempre convivi com pessoas bem mais velhas e bem mais novas do que eu, sem o menor problema. Porém tenho algo que classifico como uma "disfunção mental", que desde sempre me fez sentir como se tivesse a "idade certa". E o resto do mundo a "idade errada" (como se isso existisse!). Isto é, não importa se eu tinha 8, 12, 19, 27, 33 ou 39 anos, eu sempre estava na idade que se deveria ter para curtir a vida adoidado. E quem era bem mais velho ou bem mais novo que eu, estava com algum problema. Sim, eu sei, é uma visão maluca, torta e egocêntrica da vida. Mas eu sempre senti as coisas dessa forma, instintivamente. Sim, quando penso nisso, também acho uma besteira completa. Tomara que na Casa dos Quarenta eu não queira brigar comigo mesmo por encarar o mundo desse jeito.
Maurício: "Na verdade é que aos quarenta, pela primeira vez na vida você se dá conta que vai morrer. Que a morte não é como briga de casal, que só acontece com o vizinho. Fazer quarenta anos é o avesso de entrar na Academia de Letras: você ganha uma festa e se torna um mortal."
De uma certa forma, a morte sempre me acompanhou. Já perdi amigos, parentes, pai, mãe. Como a maioria das pessoas, pensei muito em morte na adolescência. Felizmente isso passou. Até um tempo atrás. Mas isso também passou. A morte, como é encarada pelo ocidente, não faz parte da minha vida. Minha mãe era messiânica e aprendi muito com a cultura oriental sobre a vida e a morte. Neil Gaiman, Akira Kurosawa e Allan Kardec me mostraram que a morte nada mais é do que uma passagem, e uma parte tão importante da vida quanto qualquer outra. Sem falar que é inexorável. Afinal, da vida, uma das poucas certezas que temos é de que ninguém sairá vivo dela.
Helena: "Aos quarenta anos você entra na meia-idade. Chama-se meia-idade porque é um meio termo. É quando o espírito meio que quer e a carne meio que não pode mais. Na meia-idade tudo é pela metade. A meia-idade é uma mer..."
Quando eu tinha 17, 19 anos, comecei a me fascinar por mulheres mais velhas. Sempre namorei mulheres mais velhas que eu. Na Casa dos Vinte tive duas namoradas da minha idade. Até que ao entrar na Casa dos Trinta me apaixonei à primeira vista por uma bela menina. Pela conversa e maturidade, pensava que ela tinha 25 anos. Quando já estava irremediavelmente louco por ela, após o começo do relacionamento, descobri que ela tinha... 16 anos! Passei algumas semanas me xingando no espelho do banheiro, com preconceito contra mim mesmo. Mas apesar de ter que encarar um infame "papa-anjo" sempre que escovava os dentes, tudo se resolveu. Afinal eu sempre aparentei ser mais novo e ela jurava que eu tinha 23 anos. No balanço das coisas, ela era dois anos mais velha que eu, hehehe!
Maurício: "À medida em que a gente vai envelhecendo, as letras diminuem! Jornal, catálogo telefônico, bula de remédio. Devia ser o contrário. As crianças aprenderiam a lerem grandes livros de filosofia, com a letrinha miúda. E na velhice as letras ficariam progressivamente maiores. À medida que nossos olhos se cansam."
Bem, a porta da Casa dos Quarenta já se assoma diante de mim. Entro da Rua dos 'Enta talvez para nunca mais sair. Vamos ver o que essa Casa, essa Rua têm a me ensinar. Pois depois de quatro décadas, pelo menos uma certeza eu tenho. Como diria Indiana Jones, "o que importa não são os anos, e sim a quilometragem"!
Texto de Oswaldo Lopes Jr. (na véspera de entrar na Casa dos Quarenta) e de Luís Fernando Veríssimo.
Amei a casa dos quarenta.
ResponderExcluirLindo texto.
:)
Obrigado, menina!
ResponderExcluirMas a validade do texto começa mesmo é amanhã, às sete da matina. ;-)
Beijos.
Eu tenho esse texto do Veríssimo! o mais legal foi que o Millor respondeu ao texto, falando da casa dos 50.
ResponderExcluirComo eu entrei já no meio século..
Sensacional, Angela!!!
ResponderExcluirTer um comentário do Millor no Multiply, e ainda por cima num texto do Veríssimo é uma honra!!! :-)))
Beijos aniversariantes!
haha, eu vi esse episódio!
ResponderExcluirvou entrar na casa dos trinta...
beijão
Ana
Ih..a cho que não me expremi corretamente.
ResponderExcluirQuando o Veríssimo escreveu esse texto, há 20 anos por aí; o Millor, que é dez anos mais velho que ele, leu e respondeu com uma crônica também.
Achei tão legal que guardei ambos os textos, recortados, na agenda.
Seguinte: procê que já tá de óculos e chapéu, faz muita diferença não ;-) pra mim fez, pois aos 43 comecei usar óculos pra ler, e chapéu pra tapar os brancos ;-)) ( os brancos fios, não os da memória, pois, pra estes , ainda não inventaram chapéu!) Parabéns!
Tô lembrada, Oz! Amanhã é seu aniversário... Acho muito legal que você o trate assim como um rito de passagem. Feliz dia de amanhã! E que as coisas comecem a ter forma pra você, o quanto antes.
ResponderExcluirbeijo grande
Eu tive que rever o episódio (que tenho gravado) pra preparar esse meu texto também, Ana. :-)
ResponderExcluirE é sempre um grande prazer rever "A Comédia da Vida Privada", um dos melhores programas de humor já exibidos pela Globo!
Beijos e até amanhã! ;-)
AH!... :-P
ResponderExcluirTapado que eu sou... hehehe!
Não conheço o texto do Millor. Gostaria de poder ler.
Menina, pra começar esse aí do headshot não sou eu; é o Richard Dreyfuss em "Tubarão" do Spielberg. Matt Hooper, o personagem dele no filme, é um grande role model meu. ;-)
ResponderExcluirE eu uso óculos desde a Casa dos Vinte, nunca precisei deles antes disso. E só preciso pra longe, e de vez em quando. E tô bastante grisalho também. Mas apesar de sempre me orgulhar dos meus cabelos pretos, também gosto muito dos fios prateados que têm surgido nos últimos anos. ;-)
Beijos!
Obrigadíssimo, Marthinha!!! O que é crise pessoal pros outros pra mim é alegria. Tô muito feliz em entrar na Casa dos Quarenta!!! :-)))
ResponderExcluirSó espero que o maldito inferno astral termine de uma vez por todas... :-/
Espero que as coisas tenham melhorado aí pra você, menina! Beijão!
A casa dos "enta" é especial demais - estou nela há 4 anos ;o). Aliás, todas as casas são especiais, mas a dos "enta" é arrumada de outra maneira; os enfeites são outros, a pintura idem, sem contar com o proprietário ou proprietária, tanto faz. É uma casa especial sim. Que você tenha prazer em permanecer nela o tempo que for tempo. Muitas pessoas não entram na casa dos "enta" nunca. Correm arredias e ficam nas que foram construídas anteriormente.
ResponderExcluirGostei!
Um abraço
Andiana
Oz,
ResponderExcluirTe desejo uma boa entrada na casa dos quarenta, e que você aproveite em dobro tudo o que já te fez feliz até aqui.
O que importa é o que temos na cabeça e no coração.
O resto... a gente sempre dá um jeito!
Tudo de bom pra você!!!
Gostei muito do texto, viu?
Beijos!
Rê
Obrigado pelas dicas, Andiana! Tenho certeza de que vou adorar a Casa dos Quarenta! ;-)
ResponderExcluirBeijos e seja sempre bem-vinda aqui!
Obrigado pelas palavras de carinho, Renata!
ResponderExcluirE fico feliz que você tenha gostado do texto. Nem dá pra me comparar ao grande LF Veríssimo, e é uma honra agradar meus amigos mesmo quando me coloco ao lado do mestre. :-)
Beijos, menina!
Oswaldo, um grande abraço e parabéns pela mudança. Não sei como está hoje mas a casa dos quarenta era muito divertida quando entrei lá há 17 anos atrás. Fique esperto na hora da saída, daqui há 10 anos. Costumam fazer uma pegadinha e distribuir um kit com gota, pressão alta, ciática e até "cotovelo de tenista", uma dor no cotovelo que aparece do nada em quem nunca chegou nem perto de uma raquete. Mais tarde lhe falo como estou me virando aqui na casa dos cinquenta. Uma coisa é certa: não é só dos pés que a gente fica mais longe...
ResponderExcluirque alegria ler esse seu texto, querido meu...
ResponderExcluirnão só pela entrada larga, franca e sincera à Casa dos Quarenta e pelo peito aberto e corajoso às experiências que certamente vai encontrar por lá; mas principalmente pelo humor bom, pelo positivo, pelo necessário vigor de se encarar uma nova etapa da Vida...
infernos existem sempre e este astral do qual tanto se fala eu imagino sempre que esteja situado em nossos próprios umbigos e nas justificativas que precisamos nos dar pras mazelas que nós mesmos buscamos... mas enfim... que ele passe SIM!! a hora é esta!!
e que venha o Feliz, e que venha o Belo, e que venha o Amor, e que venha a Paz, e que venha o Dinheiro, e que vc os receba a todos como ilustríssimos convidados desta sua Festa de Arromba! e com o mesmo peito aberto e com a mesma coragem! porque é preciso muita coragem, sim, amor meu, e muita disponibilidade e vontade pra receber tais convidados ilustres... porque quando eles entram pela porta da frente, é preciso que se deixe sair imediatamente pela porta de trás outros que nunca foram bem-vindos mas que se deixou que chegassem e que ficassem pela Vida afora até que se acostumasse bastante com eles: a culpa, a mágoa, o ressentimento, a miséria, a dor, a menos-valia, a tristeza, a dureza...
é preciso então que se abra bem aberta a porta da frente!
E QUE SE ESCANCARE A PORTA DOS FUNDOS!!
e vamos então sacudir esta sua festa!
AUMENTA QUE ISSO AÍ É ROCK'N ROLL!!
AMO VOCÊ !
FELIZ ( MUITO FELIZ!! ) ANIVERSÁRIO!!
sua sempre,
Kau
( ... e o resto nunca se espera
o resto é a próxima esfera
o resto é outra encarnação! )
DINDOOOOOOOOO!!
ResponderExcluirFELIZ ANIVERSÁRIO!!
amanhã eu te dou uma lambida muito gostosa e muito carinhosa!!
tô tisperando aqui em casa depois do seu almoço, tá bem??
chamosinha assim mesmo!! kiném na foto!!
BOA PROVA!!
vou dormir agora e pedir pra Papai Do Céu ficar sentadinho bem do seu lado!!
TÉ MANHÃ E MIAU!!
eu!! Dorothy!
Feliz aniversário, caro Oz, a você, que pelo que entendí há de estar fazendo alguma prova hoje de manhã, provavelmente sonado por conta da maratona cinematográfica de ontem...
ResponderExcluirParabéns, de coração!
Abraços
FELIZ ANIVERSÁRIO DE NOVO!!
ResponderExcluire tem MUITO mais OSWALDO aqui neste endereço!!
http://ubbibr.fotolog.net/love_kau/
e os amigos daqui que quiserem chegar lá pra visitar e agitar a festa, sejam muito bem vindos!!
: )
que coisa mais difícil ser gostoso, né não...??
ai, ai.......!!
(risos)
beijos mis!!
Kau!
Amei, amei, amei....!
ResponderExcluirQue bonito isso Oz...!
E eu que estava com medo de sair da casa dos vinte....!
Que venham as casas e eu preparo a mudança.... ;o)
Beijokas e FELIZ ANIVERSÁRIOOOOOO! TUDO DE MELHOR PRA VC!
:o))))
oz, a casa dos quarenta é confortável, colorida e aconchegante, viu?
ResponderExcluirestou nela há 3 anos e nunca me senti tão bem!!!
seja bem vindo e reserve espaço e tempo prá muitas travessuras!
trouxe uns enfeites pra tua estante nova de 40 prateleiras...
Parabéns, menino!
ResponderExcluirTudo de bom pra ti.
Bom...Hoje faz exatamente 1 mês que entrei nessa bela casa. Posso dizer que não doeu, risos...
ResponderExcluirE estou curtindo esse novo ciclo, acho que vou gostar dessa casa...
grande beiju!
Feliz aniversário, mocinho!
ResponderExcluirJá disse John Lennon que a vida começa aos quarenta. A dele term... brincadeira!
Quero que você viva muitos e muitos anos com seu espírito brincalhão e divertido.
Tentei te ligar e não tinha ninguém em casa.
Sai totalmente chumbada da prova, fiz sem ter dormido, na saída tava caindo aos pedaços.
E a sua prova? Foi bom pra você?
Estou ainda tentando te ligar. Queria te parabenizar ao vivo, mas esse corpinho caquético prestes a entrar nos 30 não deixou.
Queria mesmo era ver o Tubarão!!!
beijão
Ana
Oz, que lindo texto!
ResponderExcluirNa Casa dos Quarenta você encontrará alguma dor nos ossos, fios brancos nos cabelos e um pouco de sabedoria que só deverá ampliar-se nas décadas a seguir.
Em outubro eu completo os 45 minutos de meu primeiro tempo neste planeta. A Casa dos 40 me acolheu carinhosamente neste fim de primeiro tempo...
40 beijos!
Já deixei meu beijo no post da Vanessa, mas reitero que a força continue contigo. bjs RL
ResponderExcluirOz,
ResponderExcluirja passei ha muito dos 40 e posso lhe garantir que as coisas não mudam muito, na verdade a grande mudança é que se fica mais seletivo, deixa-se de pegar qualquer coisa.
bem-vindo aos enta....PARABÉNS.
abraço,
cesar