sexta-feira, 15 de outubro de 2004

Conto (3) - "ALEGRIA DE CRONÓPIO", de Julio Cortázar


ALEGRIA DO CRONÓPIO

Encontro de um cronópio e de um fama na liquidação da loja ‘La Mondiale’.

- Boas salenas cronópio cronópio.

- Boa tarde, fama. Trégua catala espera.

- Cronópio cronópio?

- Cronópio cronópio.

- Linha?

- Duas, mas uma azul.

O fama respeita o cronópio. Nunca falará se não souber que suas palavras são as convenientes, temeroso de que as esperanças, sempre alertas, esses micróbios resplandecentes, não deslizem no ar, e por uma palavra errada possam invadir o bondoso coração do cronópio.

- Chove lá fora – diz o cronópio. – céu abaixo.

- Não se preocupe – diz o fama. – Iremos no meu automóvel. Para proteger as linhas.

E olha para o ar, mas não enxerga nenhuma esperança e suspira satisfeito. Além do mais, agrada-lhe observar a alegria comovente do cronópio, que segura contra o peito as duas linhas – uma azul – e espera ansioso que o fama o convide a subir no seu automóvel.

(Julio Cortázar, em "Histórias de Cronópios e de Famas")



* * * * *


ILUSTRAÇÃO: Participação especial da minha ‘mana’ Márcia interpretando ela mesma, isto é, uma fama. Fotos tiradas sabe-se lá deus quando, numa apresentação do Coral da UERJ em Teresópolis. Provavelmente em 1983. E a chuva lá fora é do "Jurassic Park", gentilmente cedida por Spielberg e pelo T-Rex.

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